Michelin adquire Seva e pode torná-la fornecedora mundial do grupo
RIO - A Michelin comprou a Seva, empresa brasileira especializada em tecnologia automotiva com foco em sistemas de telemetria, gestão de frotas e fabricação de dispositivos eletrônicos.
O movimento é parte da estratégia do grupo francês de incrementar os serviços voltados para segurança e gestão de frotas, questões relacionadas ao futuro da mobilidade urbana.
A aquisição foi feita por meio da Sascar — outra companhia brasileira adquirida pelo grupo francês em 2014 por 530 milhões de euros.
A Michelin não divulgou o valor do negócio para aquisição da Seva. Com sede em Congonhas (MG), a cerca de 80 quilômetros da capital Belo Horizonte, a Seva tem 200 funcionários, sendo 50 engenheiros, número suficiente para triplicar a capacidade da Michelin produzir tecnologia.
Os planos do grupo francês são ambiciosos para a nova empresa. Isso porque a Seva produz pontos eletrônicos voltados para a gestão de frotas que funcionam em veículos de diferentes marcas, inclusive modelos que não estão disponíveis no Brasil. “Eles podem se tornar o fornecedor mundial do grupo Michelin. Hoje, a Michelin compra estes produtos eletrônicos na Europa, nos Estados Unidos”, diz o presidente da Michelin América do Sul, Nour Bouhassoun.
O caminho já traçado pela Sascar pode ajudar este cenário. O grupo francês decidiu, há algumas semanas, que a plataforma digital da empresa será a plataforma mundial de serviços da Michelin. Também iniciou a expansão internacional a partir da América Latina. O primeiro país foi o México, no ano passado, onde adquiriu uma empresa, a Copiloto Satelital, seguido da Argentina. O próximo passo é o Chile, o que deve acontecer ainda este ano.
Segundo Bouhassoun, a Sascar e a Seva se complementam. “A Seva tem uma entrada com montadores e também com mineração no Brasil. Vamos alavancar muito isso, para levar para fora do Brasil”, afirma o executivo. “Hoje o mundo é movido pelo ‘big data’. Com a Sascar entrando com a Seva, os engenheiros poderão ter acesso a milhões de dados emitidos pelos seus veículos”, completa. A carteira da Sascar tem 250 mil veículos e a da Seva, 8 mil - a avaliação é que há pouca superposição dos serviços.
A atuação das duas empresas está ligada a novas soluções de mobilidade urbana, que terá grandes mudanças nos próximos anos, como carros autônomos e compartilhados nas ruas. “As cidades vão se transformar em clientes para a solução de mobilidade”, diz Bouhaussoun. O recente acidente com um carro autônomo em teste do Uber nos Estados Unidos, que matou uma pedestre, não será admitido com o tempo, na visão dos executivos da Michelin. E isso exigirá investimentos relevantes. “Como é algo complexo, o investimento massivo deve ser feito muito antes de termos soluções aceitas pelo legislador”, completa.
“Fala-se muito em carros e ônibus conectados. É isso que nossas engenharias vão tratar no dia a dia e nos próximos dois anos, como também as novas tendências que virão. Precisávamos de capacidade de inovação e de engenharia”, diz o presidente da Sascar, Gilson Santiago.
Inicialmente a tecnologia foi aplicada na gestão de frotas e veículos, com foco na localização. O custo dos acidentes é 12 vezes maior do que o de roubos de carga. Questões ligadas à gestão de produtividade e redução de custos também estão no foco das novas tecnologias implementadas.
No Brasil, o faturamento de segurança, prevenção de acidentes e controle de custos da Michelin, área capitaneada pela Sascar, cresceu 8% em 2016 e 9% em 2017. Mas o potencial de crescimento é grande, já que a penetração no mercado doméstico destes serviços é de 60%. “Tem muita coisa para fazer, apesar de já ser um enorme mercado. Queremos continuar crescendo no Brasil de forma importante em prevenção de acidentes, segurança, mas criando outros negócios fora daqui”, diz Santiago.
Considerando os negócios como um todo, o Brasil representa 7% do faturamento mundial do grupo. Bouhaussoun garante que a empresa não foi afetada pela queda de produção das montadoras, nem fez demissões. Isso porque o foco se voltou para produtos mais baratos e para a Argentina.
“Quando o mercado de pneus de carga caiu forte, nossas vendas caíram muito. Aceleramos um projeto de lançar uma segunda marca em mercado de caminhões, com preço mais acessíveis, a BF Goodrich, que tem uma performance menor do que o pneu Michelin”, afirma. Agora, com a recuperação do mercado, a produção vai voltar a aumentar. A empresa também vai começar a fabricar pneus Michelin na fábrica da Levorin, em Manaus, adquirida em 2016. Ali, a produção é voltada para motos e bicicletas.
Boa parte da produção da Michelin está na fábrica de pneus de carga em Campo Grande, na zona oeste do Rio. A escalada de violência teve impactos sobre a operação, que reduziu o fluxo de entrada e saída de caminhões de 24 horas para apenas durante o dia. “Isso prejudica nossa operação de logística, nossos parceiros transportadores”, diz o executivo. A empresa precisou aumentar a segurança por causa de ataques a funcionários perto das fábricas, armas, roubo de carros e tentativas de invasão. Bouhassoun mencionou recente reunião com outras multinacionais para discutir a segurança no Rio. “Temos mais dificuldades de trazer expatriados. Eles veem imagens lá fora de pessoas armadas durante o dia, isso choca”, afirma.