Devolucao do choque de precos causado por greve pode gerar deflacao em agosto
Ainda não totalmente concluído em julho, o processo de devolução do choque provocado pela greve dos caminhoneiros deve derrubar a inflação em agosto. Com quedas previstas para alimentos e combustíveis, economistas ouvidos pelo Valor chegam a projetar deflação para o Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) no próximo mês, algo que não ocorre desde 1998. Naquele ano, o IPCA recuou 0,51% no período.
Divulgado na última sexta pelo IBGE, o IPCA-15 cedeu de 1,11%, em junho - mês que capturou o pico dos efeitos da paralisação - para 0,64%, em julho, influenciado principalmente pela perda de fôlego em alimentação e transportes. A expectativa é que esses preços sigam em descompressão, o que levará a um mês de agosto ainda mais baixo do que o normal para índices ao consumidor.
A sazonalidade já é favorável no meio do ano, período de calmaria inflacionária - lembra Carlos Thadeu de Freitas Filho, pesquisador do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas (Ibre-FGV). "Junho, julho e agosto já são meses baixos para a inflação", diz. Neste ano, junho foi marcado por pressões pontuais devido à crise de abastecimento. Mas a volta dos preços ao nível anterior está ocorrendo de forma mais intensa do que o previsto e não acabou em julho.
Por isso, o Ibre trabalha com redução de 0,1% do IPCA em agosto, mês em que os alimentos no domicílio devem recuar 1%. Enquanto em julho, os maiores responsáveis pela deflação de alimentos foram itens in natura, que respondem mais rapidamente à normalização da oferta, em agosto, serão alimentos com cadeias mais longas que vão recuar em maior magnitude, explica Freitas. Como exemplo, ele menciona a parte de proteínas animais, leite e derivados.
"Agosto vai pegar a volta completa do choque de oferta causado pela greve", afirma Breno Martins, da Mongeral Aegon Investimentos, para quem o IPCA diminuiu 0,05% no mês. O cenário é benigno sobretudo para os preços livres, porque a atividade econômica segue patinando, mas as tarifas administradas também vão contribuir com a redução da inflação, diz.
Reajustes de energia elétrica efetuados em julho em algumas capitais pesquisadas pelo IBGE levaram esse item a subir 6,77% no IPCA-15 do mês, maior impacto individual sobre o indicador. No mês seguinte, essas correções sairão de cena. Além disso, a bandeira tarifária já está no patamar 2 da cor vermelha e não pode exercer pressão adicional sobre as contas de luz.
No fechamento de julho, a tarifa de eletricidade deve desacelerar para 5,45% e, em agosto, aumentar 0,79%, estima Fabio Romão, da LCA Consultores. Os maiores vetores de descompressão sobre os preços monitorados, no entanto, devem ser os combustíveis, que estão refletindo os reajustes negativos da Petrobras e, também a safra da cana-de-açúcar, que reduz o preço do etanol na bomba.
Romão calcula que o grupo de transportes vai recuar 0,57% em agosto, devido à queda esperada para os combustíveis e à previsão de deflação de 26% das passagens aéreas apontada nas coletas da LCA. Segundo o economista, o movimento reflete apenas a sazonalidade dos preços, que costumam subir bastante em períodos de férias e cair após julho.
Com a ajuda também da retração de 0,05% prevista para alimentação e bebidas, o IPCA subirá apenas 0,06% em agosto, calcula Romão, mas chances de um número negativo são grandes: "O índice pode aparecer em deflação sobretudo se a parte de alimentos itens cair mais do que o projetado."
Além do fim dos efeitos do choque de oferta, a conjuntura ainda fraca - com elevados desemprego e ociosidade - também favorece inflação comportada, diz Freitas. No auge da greve e da valorização do dólar, o Ibre já chegou a prever alta de 4,4% para o IPCA em 2018, projeção que hoje está em 4,05%.
FONTE Valor